quarta-feira, fevereiro 04, 2009

Afinal o que são as memórias, Luís?


Deixa-te estar assim, não digas nada, não te mexas na foto da minha memória... Deixa-te estar com esse sorriso, com esse carinho na mão, com esse calor nas minhas recordações...

Não te apresses, não te expliques, não te descomponhas. Quero-te assim no meu álbum das lembranças. Com esse movimento vagaroso das tardes de verão, com os olhos nos meus ainda sem mágoas nem despedidas.

Deixa-te estar assim com esse sorriso, com esse carinho que me aquece as recordações.

Que importa se depois o adeus e depois o ainda e depois novamente o adeus. Que importa se depois os olhos já longe fugindo dos meus. Que importa se depois as mágoas, as frustrações e o abandono.

Deixa-te estar, não te mexas, quero-te assim nas minhas lembranças. Não digas nada, que eu oiço ainda as palavras que me aqueceram o corpo. Não faças nada que eu danço ainda a valsa dos sonhos impossíveis.
Deixa-te estar, assim com o Tejo como cenário e um jardim como refúgio. Não te mexas, não digas nada. Sempre achei que na cantiga (*) as memórias eram como índios escondidos no bosque... é lá que te quero, no bosque da minha imaginação escondido dos silêncios.
Deixa-te com esse sorriso... É assim que te quero lembrar, meigo, carinhoso, o "cavaleiro andante" (**) do meu mundo de aventuras.
Procuro a fórmula mágica que me ensinou um velho saltimbanco, digo as cantilenas mal ensaiadas e manipulo a memória deixando apenas as palavras, os fins de tarde, o calor do sol, os olhares cúmplices, os caminhos partilhados. Pego no resto e guardo num saco que fecho com fio de lã colorido. Subo ao cimo da montanha mais alta e, num dia de vento solto as lágrimas abafadas no saco. Solto-te no ar como um balão que voa mais alto e mais alto até que se perde no azul do céu. Deixo-te ir, aceito os adeus e os silêncios e as pequenas frustrações e as mágoas...
Volto ao jardim e ao Tejo num dia de verão e, por momentos, retiro-te do álbum onde te guardo junto ao coração.

Liliana Lima 04-02-2009


Com "Memórias de um beijo" (*) de Luís Represas no ouvido (aqui num post antigo).
(**) Referêcia a "Cavaleiro Andante" do Rui Veloso