Congela os mares para que os barcos e as canoas e as lanchas não avancem nem mais um milímetro.
Congela!
Pára as ondas que batem incessantemente nas rochas e trovejam por toda a costa.
Pára!
Cala as crianças que gritam quando riem, quando choram, quando jogam à cabra-cega e quando não querem ir dormir.
Cala!
Não vires a ampulheta para que a areia sossegue e descanse num sonho eterno de deserto.
Não vires!
Arranca os ponteiros do relógio da igreja que não deixa impune a passagem do tempo badalando-o aos sete-ventos.
Arranca!
Apaga as estradas e os caminhos, as pontes e os caminhos-de-ferro para que cada um fique apenas onde está.
Apaga!
Tapa o Sol com um manto de estrelas, trás a lua se quiseres, mas deixa apenas a noite com a paz daquele momento em que estamos quase-a-dormir-acordados, embalados pela tranquilidade de nos sabermos ser/não sendo, apenas estando.
Tapa!
E deixa-me apenas descansar...
Liliana
"Água e pedras do rio
Meu sono vazio
Não vão acordar
Água das fontes calai
Ó Ribeiras chorai!
Que eu não volto a cantar
Rios que vão dar ao mar
Deixem meus olhos secar
Águas das fontes calai
Ó ribeiras chorai!
Que eu não volto a cantar
Águas do rio correndo
Poentes morrendo
P'ras bandas do mar
Águas das fontes calai
Ó ribeiras chorai!
Que eu não volto a cantar
Rios que vão dar ao mar
Deixem meus olhos secar
Águas das fontes calai
Ó ribeiras chorai!
Que eu não volto a cantar"
"Balada do Outono" de José Afonso