Não me digas que não me compreendes, depois de tantas palavras trocadas, linhas entrecruzadas e leituras partilhadas... não me digas que não me compreendes!
Vá, abre os olhos e vê para além do reflexo que flutua no rio, cidade indizível num mundo de palavras fantasma.
Vamos! Prova que consegues ler-me as marcas no corpo quando me despes no lusco-fusco da folha.
Ah! diz-me que treinaste os teus olhos para o escuro da minha alma, emaranhado de ideias soltas como balões subindo a noite num céu de lua nova até ao infinito.
Não me digas que não me compreendes, antes procura o caminho que marquei com migalhas de luz...
Não me digas que não me compreendes, antes descobre o fio que conduz à bola em que me enrolo e me embalo na madrugada...
Não me digas que não me compreendes, antes segue os sinais de fumo que espalho desenhando a rota num mapa astral...
Se me deres tempo para crescer em árvore, ver-me-às erguer os braços no cimo da serra, e então voarás até mim num sopro de primavera!
Se me deixares abrir as asas ao vento, saber-me-às no céu num voo de águia que se anuncia pela sombra no chão, e então seguirás até mim como ovo que estala no ninho!
Se me ouvires cantar com atenção, perceber-me-às em todos os cantos num sussurrar de brisa matinal, e então encontrarás o caminho até mim num silêncio que se impõe ao ruído da cidade!
Se me soltares no ar, ver-me-às a sorrir num arco-íris brilhante, e então sobirás até mim como uma criança brincando num escorrega!
Por isso, ouve-me, descobre-me, solta-me, encontra-me, lê-me, sente-me... verás que me consegues compreender!
Liliana
Com "Que força é essa" do Sérgio Godinho no ouvido.
(*aqui, numa curva de há uns tempos...)