segunda-feira, março 16, 2009

De que palavra nasceste, António?

Fui, em palavras, mais longe do que algum dia pensei. No vazio do silêncio incendiei com palavras a esperança impossível. Dizendo, fui.

Não estarei, por isso, realmente perdida. Apenas e só consigo nascer duma pedra por uma palavra ardente. Se o digo sou-o, não sei se o pergunto ou se o respondo, mas sei que o sou... inteiramente, em palavras.

Ao poder destruidor do abandono, sobreponho a força criadora das palavras. Se o digo, se o digo verdadeiramente, é porque o vivo. Através da minha voz ergo-me nas sombras do vazio.

Não direi, certamente, que sou apenas palavra, sinto-me nua no azul da tua presença, sinto a minha boca na tua e algo que floresce quando, em mim és, para além das palavras.

Mas sei que nasci de uma palavra que, ébria, se enamorou de uma árvore e com ela foi vento, nascente e flôr e tudo o que a sede e o amor lhes permitiram, no mundo infinito da chama ardente das palavras.

Liliana Lima - 26 de Novembro de 2006






"Não sei se respondo ou se pergunto.
Sou uma voz que nasceu na penumbra do vazio.
Estou um pouco ébria e estou crescendo numa pedra.
Não tenho a sabedoria do mel ou a do vinho.
De súbito ergo-me como uma torre de sombra fulgurante.
A minha ebriedade é a da sede e a da chama.
Com esta pequena centelha quero incendiar o silêncio.
O que eu amo não sei.
Amo em total abandono.
Sinto a minha boca dentro das árvores e de uma oculta nascente.
Indecisa e ardente, algo ainda não é flor em mim.
Não estou perdida, estou entre o vento e o olvido.
Quero conhecer a minha nudez e ser o azul da presença.
Não sou a destruição cega nem a esperança impossível.
Sou alguém que espera ser aberto por uma palavra."



António Ramos Rosa - "Uma voz na pedra"