sexta-feira, fevereiro 12, 2016

TEMpo

-Tenho saudades tuas. 
Dizia ela quase em surdina, com o telemóvel encaixado entre o ouvido e a almofada. 
Dizia-o muitas vezes, mas nunca da boca para fora. Sempre que o dizia sentia-o, mas não o chegava a dizer todas as vezes que o sentia. 
Do outro lado da linha, um calmo:
-Ainda não passou assim tanto tempo, meu amor. 
Era claro para ela, que ele lhe respondia com toda a tranquilidade e carinho de quem não teme que o chão abata de um dia para o outro. Mas, habituada aos absurdos da vida, cada dia que passava pesava-lhe no corpo, prendia-lhe os movimentos e toldava-lhe o sentir. 
No entanto, apenas um:
-Pois, tens razão. 
Que caia no silêncio da almofada e ecoava pela cama, dele, e a imediata percepção da mágoa, dela. 
Ela sabia que nunca o tempo que passavam afastados seria assim, tão penoso, para ele. E ele também. E, ele sabia também que esse era, talvez, o motivo que mais pesava no tempo que corria do lado dela. 
E por isso um atenuar, um encerrar sem deixar pousar as palavras nos lençóis, de cada um:
-Cada pessoa vive o tempo de forma diferente, intrínseca. A noção de muito ou pouco tempo é dúbia e muito questionável. 
Mas de lá já uma voz ligeiramente embargada e de cá já um travo amargo na boca. 
E, nenhum a querer pisar o chão, o tal que ela tão bem sabia que a qualquer momento podia desabar. Nenhum a querer sentir os absurdos da vida, das vidas dos dois e de cada um. Nenhum a saber como embalar aquele fantasma que toda a conversa, de almofada para almofada que diariamente trocavam antes de dormir, absorvia. 

O tempo, esse, passava imune aos medos, às mágoas e às certezas dos dois e, num silêncio ensurdecedor, forçava a despedida. Do lado dela, sentida. Do lado dele, perdido. 

Entre uma cama e outra, um mundo de vivências diferentes, um oceano de experiências díspares, uma ilha de tempo comum que os unia e que, de duas maneiras, os ajudava a passar o tempo que não era deles. 

"Descansa. Bjnh"
"Noite tranquila. Bjnhs"


Liliana Lima