sexta-feira, setembro 07, 2012

Esse rio

A sala é pequena e desnudada. 

Um caos sentado à secretária separa-me das palavras que embatem a uma velocidade que, a mim, parece vertiginosa. Limpo as feridas e os arranhões mas o tempo não me deixa sarar os medos que acordam, ali naquele caos que olha fixamente da secretária e me remete para um mundo interno a que não quero chegar.

O ar simpático, quase coloquial, de toda a conversa raspa uma peça de teatro mal ensaiado onde os actores improvisam nos silêncios e se calam nas pausas. Tudo é dito e nada é devidamente entendido. Já sei que o meu lugar será aquele, que me sentarei naquela cadeira e que a postura terá de ser aquela. 


Não sei quem é o "eu" sentado na cadeira para onde olha o caos, cada vez mais intensamente. 

Sou mar revolto, sou vulcão, força de mim que inrrompe pelos céus e se entrega à terra feita raio, energia pura, em me dou sem medida e sem restrição.

Sou

Sou a criança ferida enrolada em si, num embalo de choro que não consigo sarar e que ecoa em mim e me inquieta as horas num deserto onde não deixo mais ninguém entrar.

Sou

Acredito no arco-íris e num mundo mais feliz, onde damos flores em forma de sonhos que consigo visualizar tão mais nitidamente do que esta pequena e desnudada sala, onde um caos em cima da mesa me desconcentra.

Luto com as armas da imaginação numa guerra onde, um dia, me chamaram naïf, e procuro o fumo que me levará a "esse rio" onde, aí sim, me confundirei com as águas até nelas desaparecer.


A conversa acaba onde começou e o peso dos nomes e dos rótulos, dos medos e dos receios, dos riscos e das prescrições, dos medos e dos receios, das indicações e contra-indicações e dos medos... Caem-me aos pés prendendo-me ao chão para onde, sem me ter apercebido, o caos da mesa se espalhou.

Mais uma vez, não sei quem é o "eu" que luta para se levantar e andar e sair pela porta e entrar na "realidade".

Liliana