Trouxeste os medos fechados em bolsinhas coloridas que guardaste na mochila, ao entrar.
Todas as pessoas que escondem medos debaixo do tapete sabem que podem tropeçar a qualquer momento. E, por isso, chegaste com a falsa confiança de quem vive uma farsa.
Quando te sentaste ao meu lado não consegui agarrar a curiosidade, quase patológica, de espreitar o interior das bolsinhas coloridas.
Ficámos no equilíbrio que vive suspenso entre a vontade de quem quer acolher e a turbulência de quem não se permite, sequer, a hipótese de... acolher.
É que, por princípio, o verbo é o mesmo.
Eu quero acolher os teus medos na esperança de te/me tranquilizar e tu precisas de os acolher em ti para os poderes superar. E para tal tens de, no mínimo, conseguir imaginar-te pegar em cada uma das bolsas e, mesmo sem derramar as suas cores, deitá-las ao mar.
A verdade é que a narrativa desta viagem foi algo intranquila e as bolsinhas teimaram em cair, à vez, da mochila que ficou aos teus pés.
Ao teu lado eu fui descobrindo formas, cores, fechos e laços, todos tão diferentes uns dos outros, bonitos até. Para mim claro, que apenas os via a saltar da mochila com os solavancos da viagem.
Acho que te tentei até ajudar, a apanhar e guardar uma das bolsas, mas o teu "medo até de ter medo", não me deixou aproximar mais do que a distância social (completamente subvertida à necessidade capital).
As viagens são como o Teorema de Pitágoras, tudo somado partida e chegada têm sempre o mesmo peso.
Então partimos, lado-a-lado, numa viagem em que tu chegaste com uma mochila cheia de medos que pousaste a teus pés. E eu parti do conforto (?) de quem se consegue contar em mil espelhos e escolher a qual vai perguntar se há no mundo alguém mais complicado, do que eu.
E então chegámos, de uma viagem conturbada, da qual tu partiste com a mochila às costas e a vitória de ter sobrevivido mais umas horas nesse instável equilíbrio. E eu cheguei com o sensação de vazio de ter deixado na porta de embarque mais do que devia deixar e a impotência de não te saber ajudar, aqui tão perto, mesmo ao meu lado.
Todas as pessoas que escondem medos, sabem que podem tropeçar a qualquer momento.
No cais desta viagem, quem tropeçou? Eu? Ou tu?
Liliana Lima
Algues sobre o Atlântico